Educação e Cidadania Plena na agenda global

Declaração da LBV para a Reunião de Alto Nível do Ecosoc/ONU sugere caminhos para o desenvolvimento sustentável

Da redação

30/06/2014 às 17h11 - segunda-feira | Atualizado em 22/09/2016 às 16h02

Esta declaração apresenta propostas da Legião da Boa Vontade (LBV) sobre o tema da Reunião de Alto Nível do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas (Ecosoc) em 2014: “Discutindo os desafios em curso e os emergentes para atingir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) em 2015 e para sustentar os ganhos de desenvolvimento no futuro”. A LBV defende a educação como o eixo central da agenda de desenvolvimento global, em suas inter-relações com a saúde, as questões de gênero, a inclusão produtiva, a sustentabilidade e a articulação social.

As recomendações são fruto da experiência de mais de seis décadas de atuação da LBV e do resultado dos debates que ela promoveu por intermédio do 10º Fórum Intersetorial Rede Sociedade Solidária, uma série de eventos realizados de 20 a 29 de novembro de 2013, na Argentina, no Paraguai, no Uruguai e no Estado Plurinacional da Bolívia. Os encontros tiveram o suporte do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas (Desa/ONU) e a presença de representantes de diversos órgãos locais do Sistema ONU (Unic, Unesco, Unicef e Pacto Global).

Frentes de ação da LBV

A Instituição mantém bases autônomas nos quatro países citados, nos Estados Unidos da América e em Portugal, além de possuir 77 unidades de atendimento no Brasil e nos países que mantém bases autônomas. Foi fundada em 1º de janeiro de1950 (Dia da Confraternização Universal), no Rio de Janeiro/RJ, Brasil, pelo jornalista, radialista e ativista social Alziro Zarur (1914-1979), sucedido na presidência da LBV pelo jornalista, radialista e escritor José de Paiva Netto. Atua por intermédio de Centros Comunitários de Assistência Social, escolas, lares para idosos, campanhas e ações emergenciais. Em 2013, mais de 250 mil pessoas foram impactadas pelo seu trabalho social transformador no Brasil e nos países que mantém bases autônomas.

Somente em nosso país, de 2000 (primeiro ano dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio — ODM) a 2013, foram prestados 90 milhões de atendimentos e benefícios à população em situação de vulnerabilidade ou risco social, investimento possibilitado majoritariamente por doações de indivíduos. A Instituição também incide nas políticas públicas, participando dos conselhos de defesa de direitos, órgãos pelos quais a sociedade civil dialoga com os gestores governamentais. No âmbito internacional, associou-se ao Departamento de Informação Pública (DPI) da ONU há mais de duas décadas e tem status consultivo geral no Ecosoc há quinze anos (desde 1999).

A comunicação faz parte do importante trabalho da Legião da Boa Vontade desde a sua origem, pois ela já existia como ideia e movimento ecumênico a partir do programa radiofônico Hora da Boa Vontade, iniciado meses antes (em 4 de março de 1949), na Rádio Globo do Rio de Janeiro/RJ. Por isso, a LBV utiliza-se hoje de uma ampla rede de rádio, TV, mídia impressa e internet na defesa de causas socioambientais e para promover educação, cultura, desenvolvimento social e valores de cidadania. Tendo preparado centenas de profissionais que atuam no mercado de comunicação com essa visão diferenciada, atualmente estrutura em São Paulo, Brasil, uma escola técnica na área audiovisual.

Educação e os ODS

O compromisso com a educação de qualidade é o foco da Instituição. Num momento em que as nações definem prioridades comuns para o ensino nos próximos anos (dentro dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável), a LBV defende a necessidade de adicionar aos atuais indicadores de progresso mecanismos que permitam a avaliação não somente de proficiência linguística e em exatas, mas também do número de casos de intolerância e de violência, de comportamentos não saudáveis (entre eles o consumo de drogas lícitas e ilícitas), da participação solidária e democrática, da sensação de bem-estar subjetivo e da adesão a hábitos sustentáveis.

Essas são algumas das estatísticas cuja melhoria é viável ao fortalecer o enfoque preventivo das políticas públicas, especialmente as de Educação. A Legião da Boa Vontade utiliza diversas estratégias para fomentar sistematicamente a reflexão com os estudantes, a exemplo de fóruns infantojuvenis, concursos culturais, envolvendo oficinas de debate e produção artística. Desenvolvidos durante o ano por meio de atividades socioeducativas, os fóruns têm encontros especiais abertos à comunidade, em que as crianças e os jovens são os grandes protagonistas, inclusive na condução dos eventos.

Outra frente de ação concerne à segurança infantojuvenil. Em razão de 60% do total de pessoas atendidas pela LBV por meio de seus programas socioeducacionais serem crianças e adolescentes oriundos de famílias de baixa renda, a Instituição está engajada em iniciativas intersetoriais que visam à proteção dos públicos vulneráveis à exploração e ao tráfico de seres humanos.

Suas escolas recebem crianças a partir dos 4 meses de idade em período integral, permitindo que as mães possam trabalhar e aumentar a renda da família. Esse caminho também é trilhado pelos governos dos países onde a LBV atua, os quais têm se desafiado a estender esse benefício ao maior número possível de crianças matriculadas na rede pública.

A LBV focaliza as famílias mais pobres, buscando compensar as desvantagens sociais a que os filhos delas estão sujeitos. Por isso, eles são acompanhados, com as respectivas famílias — geralmente apenas a mãe —, por uma equipe multidisciplinar, formada por assistentes sociais, psicólogos, nutricionistas e pedagogos. Suas comunidades integram programas e projetos de inclusão social que contribuem para o desenvolvimento sustentável. Para o atendimento a demandas de alimentação, educação, renda, saúde e meio ambiente, a ação é articulada com órgãos públicos, outras organizações e profissionais parceiros.

Toda essa atenção integral dada ao indivíduo tem alcançado expressivos resultados, como índice de evasão escolar zero e ambientes em que se vivencia a Cultura de Paz, além de rendimento acadêmico superior às médias nacionais. Isso demonstra que a criação de espaços para reflexão e vivência da cidadania e de valores ecumênicos, isto é, universais, colaboram para melhorar o desempenho escolar dos estudantes.

Na área da saúde, por exemplo, há mais de duas décadas a Instituição desenvolve a campanha educativa Não use drogas. Viver é Melhor!. Esforços nessa direção são extremamente necessários. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 14% da carga global das doenças é atribuída a transtornos mentais e neurológicos e ao abuso de substâncias psicoativas. O alto custo do tratamento dessas enfermidades, ao qual uma minoria tem acesso, pode ser muito reduzido no caso do consumo de drogas e de medicamentos não prescritos. Dados do Relatório Anual de 2013 da Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecentes mostram que a cada dólar gasto em prevenção, pode-se economizar até dez dólares em custos posteriores para os governos.

A LBV sistematizou sua experiência educacional por intermédio da Pedagogia do Afeto (direcionada às crianças de até 10 anos) e da Pedagogia do Cidadão Ecumênico (a partir dos 11 anos de idade), que integram a linha pedagógica criada pelo educador Paiva Netto. Com uma metodologia de trabalho consolidada — o MAPREI (Método de Aprendizagem por Pesquisa Racional, Emocional e Intuitiva) — e de estrutura curricular em diálogo com os parâmetros de cada país, essa proposta educacional tem, crescentemente, sido objeto de estudos científicos e de capacitações para educadores das redes pública e particular de diversas nações.

Ao inaugurar o Centro Educacional da LBV no Rio de Janeiro, em 1996, num discurso para mais de cem mil pessoas, o diretor-presidente da LBV, José de Paiva Netto, declarou:

(...) Reclama-se de que crianças e jovens na rua assaltam, matam, invadem as casas, aborrecem as outras crianças e jovens que têm meios mais fartos de viver. Elas, porém, somente estão devolvendo o que lhes proporcionam. Se lhes oferecem lixo, como iriam retribuir? Então, por que reclamar? (...) Este assunto da infância e juventude na rua merece séria reflexão, para que sejam postas em prática medidas acertadas”.

Fórum intersetorial

O 10º Fórum Intersetorial Rede Sociedade Solidária reuniu governos, empresas, organizações da sociedade civil, acadêmicos e cidadãos comuns de quatro países sul-americanos. Os encontros ocorreram sobre o tema gerador “Caminhos do futuro para a Educação — O ensino na agenda global de desenvolvimento pós-2015”, numa abordagem universal, mas sem deixar de considerar as desigualdades e as diferenças culturais inerentes a cada localidade.

O fórum faz parte de um processo permanente de articulação entre organizações da sociedade civil, órgãos públicos e empresas, sendo realizado pela LBV com o objetivo de potencializar os resultados de ações sociais transformadoras. A fim de fortalecer a rede, em diversas cidades a Instituição promove, em parceria com outras organizações, encontros de capacitação com atores sociais, principalmente lideranças comunitárias, contribuindo para que desenvolvam uma ação mais qualificada, em sintonia com as políticas públicas e com os compromissos internacionais de cada país na área dos direitos humanos.

A seguir, algumas das recomendações e boas práticas trazidas pelo fórum intersetorial.

  • Vincular o processo educacional com as agendas de desenvolvimento sustentável dos níveis local, regional e nacional. Promover políticas visando à inclusão dos jovens em processos políticos de tomada de decisão.
  • Fomentar a criação de planos de responsabilidade social nas universidades a partir de experiências exitosas. Estabelecer na grade curricular delas a prática social ou comunitária de forma obrigatória.
  • Reformular os planos de ensino e capacitar os docentes para favorecer maior protagonismo dos estudantes.
  • Elaborar e aplicar nas escolas de educação básica programas de apoio a pais, professores e cuidadores sobre consumo responsável, instrumentalizando-os para trabalhar esse tema com meninas e meninos de diferentes faixas etárias e contextos sociais.
  • Criar novos indicadores globais para avaliar as políticas educacionais no que se refere à equidade de gênero, pois, apesar do avanço da escolaridade feminina, persistem fatores geradores de desigualdade, principalmente a discriminação contra determinados grupos étnicos.
  • Promover, em países com histórico de colonização, políticas de afirmação das línguas originárias no contexto educacional.
  • Constituir no âmbito das Nações Unidas um Conselho Ecumênico Consultivo em Espiritualidade, que interaja com os governos locais e com os organismos internacionais, reconhecendo a Espiritualidade como um direito constitutivo da dignidade humana. Introduzir a temática em todos os níveis educativos e fomentá-la nos meios de comunicação de massa.

Ecumenismo

A causa ecumênica é defendida pela Legião da Boa Vontade como caminho para a promoção da Cultura de Paz e da tolerância étnica e religiosa. Esse conceito, “que transcende em muito o aspecto religioso”, preconiza “a conciliação universal de todo o conhecimento humano e espiritual, numa poderosa força a serviço dos povos”, conforme define Paiva Netto.

Conclusão

A LBV coloca-se à disposição para cooperar com países e organizações no aprofundamento dos conteúdos apresentados e na reaplicação de suas tecnologias sociais.

Na visão da LBV, não há tecnologia social mais eficaz do que o investimento efetivo na educação. Conforme tese defendida há décadas pelo educador Paiva Netto, “ao lutarmos em favor da sustentabilidade, devemos trabalhar para que esta seja compreendida em seu mais profundo significado, e não vista segundo um pensamento econômico que sobrevive pela avidez, não liquidando apenas as criaturas humanas por força do desemprego e da fome em várias regiões do planeta, mas também pela carência de instrução, que nega melhor perspectiva à juventude. Contudo, existem, por todo lado, esforços de pessoas decididas a corrigir tal situação, que trava o crescimento de muitos países. E não basta instruir; é preciso educar, reeducar! Em diversos lugares, onde a economia se tornou mais forte, após certo tempo, por falta de maior investimento nos princípios éticos e espirituais, a violência, que diminuíra, ressurge, advinda tantas vezes da arrogância contra os que têm menos em suas fronteiras ou fora delas. Aí se atinge o relacionamento internacional. Por quê? Porque faltou o ensino, muito mais, a Reeducação, que é a Educação com Espiritualidade Ecumênica”.