A partícula de Deus e os Novos Paradigmas da Matéria

Esta é a segunda parte da série “A Matéria Espiritual”, originalmente publicado na revista BOA VONTADE, nº 227, de 2010, sob o título “LHC, ‘a partícula de Deus’ e o destino da Ciência”, revisado e ampliado pelo autor.

Juliano Carvalho Bento

29/04/2021 às 11h31 - quinta-feira | Atualizado em 25/04/2022 às 14h35

“A partícula de Deus”

Vivian R. Ferreira

Juliano Carvalho Bento, físico e responsável pelo Instituto de Estudo e Pesquisa da Ciência da Alma dentro da Academia Jesus, o Cristo Ecumênico, o Divino Estadista.

Em 1964, o físico britânico Peter Higgs, propôs a existência de uma partícula que explicaria a existência da massa nos demais corpúsculos quânticos. Tal conceito permeou o Modelo Padrão como uma boa teoria, mas sem ainda possibilidade de comprovação, uma vez que seriam necessários experimentos com uma quantidade de energia impossível de se obter até então.

Contudo, com a construção do LHC, tal possibilidade surgiu. E novamente grande furor acadêmico se originou da verificação dessa parte da teoria na comunidade científica.

Em 1993, Leon Lederman, Nobel de física de 1988, em seu livro “The God Particle: If the Universe Is the Answer, What Is the Question?” intitulou esse bóson de “The God Particle” que, em tradução livre, pode ser compreendida como “A Partícula de Deus” ou “A Partícula Divina”. Lederman fez essa analogia para indicar a relevância para o Modelo Padrão de tal partícula, porém o também fez com intenções comerciais (como ele próprio menciona em seu livro), para atrair atenção para a necessidade de investimento no setor científico. Contudo, bastou isso para gerar um grande furor midiático, trazendo um assunto de física de fronteira para os jornais e programas de notícias populares. Seja como for, o Nobel de física de 1988 prestou um grande serviço para popularizar o termo.

Essa partícula divina, porém, tem um nome técnico: O Bóson de Higgs. Compreender sua importância para quem não é um físico de partículas, entretanto, não é algo tão simples. Para resolver esse impasse, o físico e professor do IFT - UNESP, Rogério Rosenfeld, em seu livro “O Cerne da Matéria” criou uma excelente analogia para justamente verificarmos, de forma mais clara, qual a importância dessa para o Modelo Padrão e para toda a física. Contudo, como qualquer analogia, o professor nos alerta, “são sempre limitadas e imperfeitas, e esta não é exceção”:

"[...] Imagine que sejamos seres aquáticos confinados em um mundo totalmente submerso em água. Certamente teríamos dificuldade em mover objetos, devido à presença da água. Lembre que a massa de um corpo está relacionada com sua inércia, ou seja, com a dificuldade de colocá-lo em movimento. Portanto, a “massa” que medimos de corpos é maior do que sua massa real, caso não houvesse água. Se nosso mundo imaginário fosse totalmente submerso em mel, a “massa” medida seria ainda maior, pois o mel é muito mais viscoso. O Modelo Padrão pressupõe que estejamos imersos em um meio absolutamente homogêneo, denominado “campo de Higgs”. As partículas elementares ganham massa ao se mover nesse meio. Suas massas seriam decorrentes das interações com o campo de Higgs. Nesse modelo, partículas que interagem de maneira distinta nesse campo possuem diferentes massas. Quanto mais intensa sua interação com o campo de Higgs, maior é a “viscosidade” do meio e, portanto, maior é sua massa.

"Teorias, porém, precisam ser testadas experimentalmente. Na analogia com o mundo subaquático, um modo de comprovar a existência da água seria fazer uma onda, por exemplo, atirando uma pedra na superfície. Isso exigiria certo esforço, muito maior se o ambiente fosse de mel. No caso do campo de Higgs, temos de fazer algo parecido, ou seja, dar uma “balançada” no campo para gerar uma onda. No jargão, dizemos “perturbar o campo de Higgs”. Essa onda no campo de Higgs é representada por uma nova partícula, o bóson de Higgs. Contudo, não é nada fácil balançar esse campo. É necessária uma imensa concentração de energia em uma região minúscula, quase um ponto. Esse feito pode ser realizado com a ajuda dos aceleradores de partículas. As colisões de partículas — prótons, no caso do LHC — podem balançar o campo de Higgs e produzir o bóson de Higgs."

De forma resumida, a existência do Bóson de Higgs implicaria na descoberta da origem da massa. A dificuldade em definir grandezas físicas tão fundamentais como o espaço, tempo, energia e a própria massa, torna essa partícula essencial para desvendar a estrutura do universo, como nunca antes.

Finalmente em 2012, tivemos a notícia da descoberta dentro do LHC de uma partícula com características propostas por Higgs. O que gerou grande comoção no meio acadêmico. Essa descoberta rendeu a Peter Higgs o prêmio Nobel de 2013 “pela descoberta teórica de um mecanismo que contribui para nossa compreensão da origem da massa nas partículas subatômicas, e que recentemente foi confirmada através da descoberta da partícula elementar prevista, pelos experimentos ATLAS e CMS no Large Hadron Collider do CERN".

O Modelo Padrão e o Paradigma da Matéria

Todavia, temos que tomar um grande cuidado, para que os gigantes engenhos científicos não escolham a realidade dos fatos “mais apropriada”. Assim, assumir para sempre uma única interpretação, que no caso hoje, podemos dizer, é estritamente material, é talvez caminhar para um sentido diverso do que as descobertas aparentam caminhar.

Algo interessante de se notar, é que de uma estrutura rígida como o átomo de Demócrito e Leucipo, verificamos milhares de anos depois que a estrutura prima do cosmos está longe de ser algo maciço, o que gera uma total contraposição com a definição de matéria macroscópica que estamos acostumados. Provavelmente a tecnologia avançará muito ainda, e essa, com certeza, não é a fronteira final do microcosmos. Mas, o que verificaremos ainda? Obviamente existem partículas que são previstas por alguns modelos teóricos, porém ainda não verificadas como o gráviton1, por exemplo. No entanto, seria essa a única escolha?

Por que, então, não abrir parcialmente mão do paradigma material (já que esse caiu a muito tempo) e sondarmos um pouco a metafísica de alguns fatos, para recolher algo que pode ser proveitoso para um melhor conhecimento da realidade? E para aqueles que acham que a ciência não é feita de escolhas, basta lembrar que a própria mecânica quântica foi fundamentada na interpretação de Copenhagen, embora existisse uma descrição quântica da realidade mais causal de David Bohm (a Teoria de De Broglie-Bohm), por exemplo e a própria mecânica clássica de Newton também não foi a única existente na história da física. Ou seja, na própria ciência existem teorias, postulados e mecânicas que acabam por se sobressair dentre as demais, pelos mais diferentes motivos, e mesmo assim não estão necessariamente equivocadas.

O que desejamos argumentar é que graças as previsões do Modelo Padrão, conseguimos comprovar uma quantidade inimaginável de partículas e teorias que antes eram puramente teóricas. Mas, existe diversos pontos onde o Modelo falha, o que levou alguns físicos a compreendê-lo, em certo momento, como uma colcha de retalhos ao invés de uma teoria única e linear desde seu início.

Sheldon Lee Glashow, ganhador do prêmio Nobel de Física de 1979 e Professor de Matemática e Física na Universidade de Boston, tem afirmado em entrevistas que após a descoberta do Bóson de Higgs, afirmou que “Agora o Modelo Padrão está completo. Completo e insatisfatório" . Isso porque o modelo requer que certos valores matemáticos sejam ajustados com cuidado excessivos, e partículas que deveriam ser observadas nas faixas de energia que hoje o LHC opera, não foram visualizadas, em especial aquelas que evidenciariam a supersimetria2.

Além disso, diversas perguntas o Modelo Padrão não consegue responder, como, por exemplo, por que existem só três famílias de férmions e nenhuma mais? Por que a massa do neutrino é comparável com a constante cosmológica? Por que existem diferenças enormes entre massas de partículas elementares como alguns quarks e neutrinos? O que é matéria escura? Por que existe tanta matéria no universo? A própria existência do gráviton mencionado e diversas outras questões sem respostas.

Assim, devemos ter cuidado quando pensamos que tudo já está respondido e o acelerador verificará tudo com naturalidade. O “átomo de Pascal” sempre estará lá para nos lembrar de nossa ignorância.

Ler também:


+ A Matéria Espiritual - Os Fantasmas do LHC e a Unificação da Matéria-Espírito (Parte Final)

+ A Matéria Espiritual - O LHC e o Átomo de Pascal (Parte 1)

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1 Partícula hipotética que existiria com base na Teoria Quântica de Campos. Seria uma partícula que intermediaria a força gravitacional no universo.

“A supersimetria é uma simetria notável. Na física de partículas elementares, ela interrelaciona partículas completamente diferentes: os férmions (como os elétrons, prótons e nêutrons), que constituem o mundo material, e os bósons (como os fótons), que geram as forças da natureza. Os férmions são os individualistas e solitários do mundo das partículas: dois férmions jamais ocupam o mesmo estado quântico. Sua aversão a companheiros íntimos é forte o bastante para evitar o colapso de uma estrela de nêutrons, mesmo quando a gravidade supera todas as outras forças da natureza. Os bósons, ao contrário, são imitadores de fácil convívio, e unem-se prontamente em estados idênticos. Cada bóson que se encontra num certo estado instiga os outros de sua espécie a imitá-lo. Sob condições propícias, os bósons formam exércitos de clones. É o que ocorre com os fótons de um raio laser ou os átomos do hélio-4 superfluido. Porém, no espelho mágico da supersimetria, os anti-sociais férmions de alguma maneira se parecem com os sociáveis bósons – e vice-versa. De forma figurada, pode-se dizer que a supersimetria é um tipo de simetria que permite comparar maçãs e laranjas. Segure uma maçã diante do espelho da supersimetria, e o reflexo dessa maçã terá a aparência e o sabor de uma laranja. Nenhuma simetria simples existente na física possui essa magia. Simetrias simples podem agir como os espelhos deformadores de um parque de diversões, fazendo, por exemplo, com que inofensivos elétrons se pareçam com fantasmagóricos neutrinos, mas nunca poderiam transformar um férmion num bóson. Só a supersimetria é capaz de fazê-lo. Essa é, pelo menos, a teoria. Os teóricos das partículas elementares estudam com afinco a supersimetria desde sua invenção, na década de 1970, e muitos creem que ela guarda a chave para o próximo grande avanço em nossa compreensão das partículas e das forças fundamentais. Os pesquisadores experimentais, no entanto, procuraram as partículas previstas pela supersimetria em seus aceleradores de altíssima energia, até agora sem resultado.” FONTE:<http://sciam.uol.com.br/supersimetria/>.