Será Alzheimer?
Quanto mais rápido for feito o diagnóstico e o tratamento da doença, melhores serão os resultados.
Mariane de Oliveira
26/11/2014 às 15h34 - quarta-feira | Atualizado em 22/09/2016 às 16h04
Quem nunca, por um momento que seja, se esqueceu do dia da semana, do nome de um conhecido ou de algo que iria realizar em um determinado momento? Pois é, situações como essas são mais comuns do que se imagina, mas é preciso atenção: quando esse tipo de ocorrência, aparentemente inofensiva, deixa de ser esporádica e tira a autonomia do indivíduo de realizar atividades habituais, é a hora de procurar ajuda médica, pois pode ser indício de um problema sério que, a cada dia, afeta mais pessoas no mundo todo: o Alzheimer, doença neurodegenerativa que provoca a perda de funções cognitivas, como a memória de fatos recentes e antigos, dificuldades na linguagem e desorientação espaço-temporal.
“Em qualquer idade, você pode ter lapsos de memória, até quando criança, mas o que se vê em pessoas que estão começando a desenvolver a doença é que eles são mais frequentes e começam a interferir no dia a dia delas”, alerta o neurologista Paulo H. F. Bertolucci, chefe do setor de Neurologia do Comportamento da Escola Paulista de Medicina (Unifesp).
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que existam no mundo aproximadamente 36 milhões de pessoas que sofrem de demências, a maioria ligada ao mal de Alzheimer, podendo chegar a 115 milhões até 2050. No Brasil, calcula-se que haja 1,2 milhão de casos, a maior parte deles ainda sem diagnóstico, isso porque os sintomas da doença tendem a ser confundidos com o processo de envelhecimento natural do indivíduo e outras enfermidades, dificultando o reconhecimento precoce da patologia.
Márcia Maria Corrêa dos Santos, do Rio de Janeiro/RJ, sabe bem o que é isso: em 2002, seu pai, Jorge Eugênio dos Santos (1925-2012), na época com 76 anos, dava os primeiros sinais da doença, que só veio a ser identificada pela família anos mais tarde. “Estávamos numa casa de praia em Rio das Ostras, no Rio de Janeiro, e o meu pai, que sempre foi uma pessoa ativa, acabou ficando perdido quando dava uma volta pela cidade. Lembro que, na época, achamos estranho, mas tanto nós quanto o médico que o acompanhava acabamos atribuindo o fato à idade dele”, contou a filha.
Segundo ela, a falta de conhecimento sobre o mal dificultou associar os sintomas apresentados pelo pai ao Alzheimer. “Ele fazia tudo sozinho, mas, aos poucos, realizar pequenas tarefas foi ficando difícil, porque foi esquecendo as coisas, palavras, os hábitos de higiene... Começamos a nos preocupar e procuramos ajuda médica. Ele até chegou a ser diagnosticado com o mal de Parkinson, por causa dos tremores nas mãos. Nesse tempo, o Alzheimer não era tão conhecido como agora”, disse.
O resultado efetivo só veio à tona após longa investigação clínica. A partir de então, além do tratamento médico, que ajudou a retardar o avanço da doença, a família teve que se adaptar à nova realidade: “Contratamos uma pessoa para ajudar minha mãe a cuidar do meu pai. Também nos revezávamos. Era muito triste vê-lo daquele jeito. Víamos que ele também sofria com a sensação de que estava perdido. Ele dizia: ‘Eu não estou entendendo nada’”.
Márcia relata que a evolução do quadro deixou a família um pouco desorientada, com uma sensação de impotência ao ver a perda da autonomia dele, sem saber se tinham feito o melhor. Para ela, a resposta a esses questionamentos veio muito forte na última semana de vida do pai: “Na grandeza da Providência Divina, pude ficar com ele no último dia antes da internação, que culminou com sua morte. E ele, em um momento de lucidez, no leito do hospital (antes de entrar para o CTI), segurou minhas mãos e disse: ‘Me desculpa, tá?’. Essa mensagem soou como um agradecimento, lavando minha alma. Agradeço a Deus por isso”.
De acordo com a especialista em gerontologia social Vera Pedrosa Caovilla, membro-fundadora da ABRAz — Associação Brasileira de Alzheimer, trabalhar em parceria é o segredo para lidar com a situação. “É muito comum ter a figura do ‘familiar-cuidador’, aquela pessoa que fica mais tempo com o parente com Alzheimer, mas ela não pode ser a única responsável durante as 24 horas do dia. É preciso ter todos os envolvidos cuidando desse paciente, todos cuidando de todos”.
Fatores de risco
Desde a descrição da doença, feita em 1906 pelo psiquiatra e neuropatologista Alois Alzheimer (1864-1915) — daí a origem do nome —, diversos estudos foram realizados com o objetivo de encontrar as suas verdadeiras causas e como detectá-la ainda em estágio inicial. Recentemente, passo importante foi dado nessa direção: um grupo de cientistas britânicos identificou dez proteínas no sangue que podem sinalizar a presença da enfermidade no organismo humano, avanço que futuramente permitirá a sua identificação por exame de sangue simples.
Outros estudos apontam a existência de fatores de risco para o surgimento da patologia. O principal deles, de acordo com a ABRAz, é a idade. Para se ter ideia, a partir dos 65 anos, as possibilidades de ter esse mal dobra a cada cinco anos. Além disso, pessoas com histórico familiar têm mais chances de desenvolvê-la no futuro, se comparadas com aqueles sem antecedentes.
Hipertensão, diabetes, obesidade, tabagismo e sedentarismo são outros fatores que podem contribuir para que a enfermidade se manifeste precocemente. “Se você corrige isso, pode fazer com que a doença aconteça mais tarde. É possível também que a pessoa viva sem ela e morra por outra razão, sem ter passado pelo Alzheimer”, afirma o neurologista Paulo Bertolucci.