Deficiência auditiva e a solidariedade pela inclusão

Wellington Carvalho

17/06/2014 às 12h29 - terça-feira | Atualizado em 22/09/2016 às 16h01

Os pais devem estar atentos aos sintomas que as crianças podem evidenciar quando apresentam alguma dificuldade em ouvir, para que não tenham o desenvolvimento integral afetado.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 360 milhões de pessoas em todo o mundo sofrem de perda de audição. No Brasil, cerca de 9,6 milhões possuem algum tipo de deficiência auditiva, como aponta dados do mais recente censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Fonoaudióloga Christiane Godoy.


Na infância, o problema não causa só prejuízos a curto ou em longo prazo, mas afeta todo o desenvolvimento, como a fala. “Apesar de ainda não falarem, os bebês ouvem os pais e pessoas ao seu redor e assim aprendem. As mães, desde cedo já conversam com seus pequenos, que choram, espirram, tossem e emitem sons como forma de comunicação”, explica a fonoaudióloga Christiane Godoy.

Por isso, os pais devem estar atentos a alguns sintomas que evidenciam dificuldades em ouvir, como: 

— Não reagir a sons altos, bem como não localizar a fonte da sonaridade;
— Dificuldade em imitar sons;
— Atraso na fala e possibilidade de não ser compreendida;
— Não conseguir identificar partes do corpo quando alguém pergunta;
— Ficar alheia a situações em grupo, como conversas e brincadeiras;
— Dificuldade em compreender o que as pessoas falam;
— Desempenho escolar abaixo da média.

Ao perceberem essas situações, a fonoaudióloga explica que os pais devem “procurar um otorrinolaringologista para diagnosticar e indicar o melhor tratamento, podendo ser medicamentoso, cirúrgico ou até mesmo com o uso do aparelho auditivo”. Essas medidas são essenciais para que a criança não perca totalmente a sua capacidade auditiva no decorrer do tempo.

Contudo, Christiane ressalta que, em determinados casos, os pais não precisam considerar rebaixada a qualidade de vida dos seus filhos quando o quadro da deficiência auditiva já se encontra avançado. Eles podem promover a inclusão dos pequenos por meio da tecnologia, de modo que tenham uma vida comum: “É por meio desse aparelho auditivo que a criança conseguirá ter contato com o mundo sonoro; esse auxilio é fundamental para que o desempenho da criança”.

Mas é importante salientar que a prevenção é imprescindível. “A detecção precoce reduzirá o prejuízo da deficiência auditiva, melhorando o desenvolvimento de seu filho”, destaca a fonoaudióloga.

ACESSIBILIDADE DURANTE OS ESTUDOS

O pequeno Eduardo* usa um aparelho auditivo. Ele tem surdez bilateral e problemas provocados por uma paralisia cerebral, decorrente de parada cardíaca que sofreu após nascer. Por recomendação médica, fez a cirurgia de implante coclear (chamado de ouvido biônico, que proporciona ao usuário sensação auditiva próxima da fisiológica), a fim de melhorar a conectividade e o interesse pelo ambiente e pelas interações sociais.

No momento em que os pais tiveram de procurar uma instituição educacional para o filho, a prioridade foi escolher uma que trabalhasse não apenas aspectos relacionados à formação intelectual e cognitiva, mas também focalizasse o desenvolvimento afetivo e emocional. E foi no Conjunto Educacional Boa Vontade que eles encontraram um ambiente seguro para confiar a educação do menino. 

Nele, Eduardo recebe todo o conteúdo pedagógico por meio da Língua Brasileira de Sinais (Libras) dentro da Pedagogia do Afeto que, direcionada às crianças de até 10 anos de idade, integra a inovadora linha pedagógica da LBV junto com a Pedagogia do Cidadão Ecumênico (aplicada aos pré-adolescentes de 11 anos em diante).

A chegada de Eduardo mobilizou toda a equipe multidisciplinar do Conjunto Educacional. Rapidamente, foram planejadas estratégias educacionais de inclusão, dentro e fora da sala de aula, complementares à medida prevista em lei — decreto nº 5.626/05 —, que determina às escolas regulares, públicas ou privadas, a contratação de intérprete e/ou tradutor de Libras quando houver aluno com deficiência auditiva (bilateral, parcial ou total). No entanto, mesmo com a utilização de recursos e da crescente especialização dos educadores em Libras, foram incentivadas outras atividades aos estudantes, como forma de manter a interação deles com o colega.

Oferecer aos alunos do ensino fundamental, até o 5º ano, o aprendizado da comunicação em Libras como uma prática diária no contraturno escolar representou um importante avanço na socialização de Eduardo, que passou a se relacionar melhor com os colegas. "Quando a escola iniciou o trabalho com a Libras e as crianças começaram a se comunicar com ele, foi uma tranquilidade para mim e meu marido. Antes, as crianças faziam algumas coisas para ele, porque não sabiam se ele conseguiria. Agora, ele participa de várias atividades, expressa o que sente. O semblante dele mudou, ficou mais tranquilo. Até o vínculo familiar melhorou", comentou Maria do Carmo*, mãe do garoto.

A escola também disponibilizou um netbook a Eduardo, favorecendo a alfabetização dele. Por causa da paralisia cerebral, a coordenação motora do aluno ficou comprometida, impedindo-o de desenvolver o movimento de pinça e preensão, aptidão necessária à fase de pré-alfabetização e que possibilita a escrita fina. Com a nova ferramenta, Eduardo passou a acompanhar os conteúdos da apostila utilizada pela unidade de ensino, em formato PDF; para as anotações necessárias, conta com o acompanhamento de educadoras que se comunicam com ele pela Libras.

Para Ana Paula da Silva Custódio, coordenadora do projeto LBV — Potencializando habilidades, houve um ganho importante para os colegas: "As crianças ouvintes estão aprendendo sobre a cultura dos surdos. É emocionante ver o quanto elas demonstram respeito às diferenças". Comovida com todo esse cuidado com a situação do filho e sua família, Maria do Carmo destacou: "Nós somos muito gratos mesmo. A Escola movimentou todas essas pessoas para acolher o meu filho".
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*Eduardo e Maria do Carmo são nomes fictícios.

**Colaboração: Mariane de Oliveira Luz.